Por:    Albert Einstein

  Tradução de: Cris Gomes

 

Estranha é nossa situação aqui na Terra

 

Albert Einstein (1.879-1955) anunciou as teorias especial e geral da Relatividade em 1.905 e 1.916, recebendo o Prêmio Nobel de Física em 1.921. A irreparável reverência com que ele abordou tanto o próprio universo quanto seu estudo deste, emprestou especial interesse a seus pontos de vista sobre Deus, nos quais, como esta seleção extraída da Obra “Filosofias Vivas” mostra, ele divergiu do teísmo tradicional, mas o fez de uma maneira autenticamente religiosa.

Estranha é nossa situação sobre a Terra. Cada um de nós vem para uma curta permanência, sem saber porque, ainda que, algumas vezes, parecendo intuir um propósito.

Do ponto de vista da vida cotidiana, contudo, há uma coisa que nós sabemos: aquele homem está aqui em nome de outros homens- sobretudo por aqueles de cujo sorriso e bem-estar nossa própria felicidade depende, e também pelas incontáveis almas desconhecidas a cujo destino nós estamos conectados por um vínculo de compaixão. Muitas vezes ao dia, eu percebo quanto minha própria vida, exterior e interior, está construída sobre o trabalho de meus companheiros, sobre a vida e a morte, e quão intensamente eu devo me empenhar para dar em retorno tanto quanto eu tenho recebido. A paz de minha mente é, frequentemente, perturbada pela sensação deprimente de que eu tenho tomado emprestado, em demasia, do trabalho de outros homens.

Eu não acredito que possamos ter alguma liberdade, de fato, no sentido filosófico, porque agimos não somente sob compulsão externa, mas também por necessidade interna. A frase de Schopenhauer: – “Um homem pode certamente fazer o que ele desejar fazer, mas ele não pode determinar o que ele deseja.” – impressionou-me na juventude e tem me confortado sempre, quando eu tenho presenciado ou sofrido privações da vida. Esta convicção é um perpétuo multiplicador de tolerância, porque não nos permite levar nós mesmos ou aos outros muito seriamente. Ao contrário, faz com que encaremos tudo com senso de humor.

 Meditar, interminavelmente, sobre a razão da própria existência de uma pessoa qualquer ou do significado da vida em geral, parece-me de um ponto de vista objetivo, ser completamente tolo. E ainda, cada um abraça certos ideais pelos quais guia sua aspiração e seu julgamento. Os ideais que têm sempre brilhado diante de mim e têm me preenchido com a alegria de viver são Bondade, Beleza e Verdade. Ter como uma meta conforto ou felicidade nunca foi atraente para mim; um sistema de ética construído nestas bases seria suficiente somente para um rebanho de gado.

Sem o senso de colaboração com pessoas sensatas na busca do sempre inatingível, em arte e pesquisa científica, minha vida teria sido vazia. Sempre, desde a infância, eu tenho desprezado os limites do lugar comum que, tão frequentemente, fazem parte da ambição humana. Possessões, sucesso externo, publicidade, luxúria – para mim têm sido sempre desprezíveis. Eu acredito que um simples e despretensioso modo de vida é melhor para todos, melhor tanto para corpo quanto para a mente.

 Meu interesse apaixonado por justiça social e responsabilidade social tem sempre contrastado, curiosamente, com uma acentuada falta de desejo por uma associação direta com homens e mulheres. Eu sou um cavalo para arreios simples, não talhado para junta ou trabalho em equipe. Eu nunca pertenci totalmente a um país ou estado, a meu círculo de amigos, ou mesmo à minha própria família. Estes laços têm sido sempre acompanhados por um vago distanciamento e o desejo de isolar – me aumenta com os anos.

 Tal isolamento é, algumas vezes, amargo, mas não me arrependo de ter sido banido da compreensão e compaixão de outros homens. Eu perco algo por isto, seguramente, mas sou compensado por ter me tornado independente das tradições, opiniões e preconceitos de outros, e não estou tentado a deixar a paz de minha mente em tais fundações trapaceiras.

 Meu ideal político é a Democracia. Todos devem ser respeitados como um indivíduo, mas ninguém idolatrado. É uma ironia do destino que eu tenha sido cumulado com tão gratuita e imerecida admiração e estima. Talvez esta adulação provenha do desejo não preenchido da multidão de compreender as poucas ideias que eu, com meus fracos poderes, tenha apresentado.

 Eu sei, perfeitamente, que para alcançar alguma meta definitiva é imperativo que uma pessoa possa pensar e comandar e carregar a maior parte da responsabilidade. Mas aqueles que devem liderar não devem ser guiados, e devem poder escolher seu líder. Parece-me que as diferenças que separam as classes sociais são falsas; em última análise elas se apoiam na força. Eu estou convencido que degradação segue todo sistema autocrático de violência, porque violência atrai, inexoravelmente, moralidades inferiores. O tempo tem provado que tiranos ilustres são sucedidos por canalhas.

 Por esta razão eu sempre estive apaixonadamente em oposição a regimes como os que existem na Rússia e na Itália de hoje. O que tem desacreditado as formas européias de Democracia não é a teoria básica de Democracia em si mesma, que dizem alguns é falha, mas a instabilidade de nossa liderança política, assim como o caráter impessoal dos partidos aliados.

  Eu acredito que estes partidos, nos Estados Unidos, atingiram a idéia certa. Um presidente é escolhido por um razoável período de tempo e poder suficiente lhe é conferido para que ele desempenhe corretamente suas responsabilidades. No governo alemão, por outro lado, eu gosto do cuidado maior que o estado tem com o indivíduo quando ele está doente ou desempregado. O que é realmente valioso em nossa movimentação de vida não é a nação, eu devo dizer, mas a individualidade impressionável e criativa, a personalidade- aquele que produz o nobre e o sublime, enquanto o rebanho comum permanece com o pensamento nublado e o sentimento insensível.

  Este tema me traz para a mais infame criação da mente do rebanho – a milícia nojenta. O homem que gosta de marchar alinhado e em fila, sob os acordes de música, despenca no meu conceito; ele recebeu seu grande cérebro por engano- sua espinha dorsal devia ser bastante reforçada. Este heroísmo em comando, esta violência estúpida, este patriotismo bombástico irritante- como intensamente desprezo! Guerra é deprimente e criminosa, e eu preferi ser atacado até ficar em pedaços do que participar em tais atividades. Tal mancha na humanidade deveria ser apagada sem demora.  Eu tenho em alta estima a natureza humana para acreditar que esta mancha teria sido destruída há tempos atrás, não fosse o senso comum de nações, sistematicamente corrompido através da escola e da imprensa, por razões econômicas e políticas.

A coisa mais bela que nós podemos experimentar é o mistério. É a fonte de toda arte e ciência verdadeiras. Aquele para quem esta emoção é uma estranha, que não pode mais fazer uma pausa para admirar e sentir-se arrebatado, está tão bem quanto morto: seus olhos estão fechados. Este insight do mistério da vida, com o qual lidamos, ainda que com medo – também dá origem à religião. Saber que o que é impenetrável para nós realmente existe, manifestando-se como a mais alta sabedoria e a mais radiante beleza que nossas estúpidas faculdades podem compreender somente em suas formas mais primitivas- este conhecimento e este sentimento estão no centro da verdadeira religiosidade. Neste sentido, e somente neste sentido, eu pertenço a esta categoria de homens devotadamente religiosos.

 Eu não posso imaginar um Deus que recompensa e pune os objetos de sua criação, cujos propósitos são moldados à nossa imagem e semelhança – um Deus, em resumo, que é apenas um reflexo da fragilidade humana. Nem posso eu acreditar que o indivíduo sobrevive à morte de seu corpo, embora almas fracas abriguem tais pensamentos por medo ou egoísmo ridículo. É suficiente, para mim, contemplar o mistério da vida consciente perpetuando-se por toda eternidade, refletir sobre a maravilhosa estrutura do universo que nós podemos, fracamente, perceber, e tentar humildemente compreender mesmo uma parte infinitesimal da inteligência manifestada na Natureza.

 

 

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